Grupo da UFRJ une apaixonados de vários cursos para produzir games - BetaQuest

Grupo da UFRJ une apaixonados de vários cursos para produzir games

GDP conquista primeiro e segundo lugar no Hacktudo 2018 / Foto: Divulgação/GDP

A indústria de games é a maior geradora de renda entre os meios de entretenimento. Acredite se quiser, os jogos faturam quase o mesmo valor que as indústrias do cinema e da música somadas. Foram US$ 152 bilhões em 2019, contra US$ 136 bi e US$ 19 bi, respectivamente (dados de 2018).

Mesmo tendo o terceiro maior mercado consumidor de jogos no mundo, com cerca de 76 milhões de jogadores, o Brasil é só o 13º país em receita no mercado de games. Esse cenário, porém, vem melhorando muito nos últimos anos. Afinal, de 2014 a 2018, o número de desenvolvedoras no país cresceu cerca de 182%. Só no ano passado, foram mais de 1.700 jogos produzidos aqui no Brasil.

Ainda que os incentivos estatais e privados estejam contribuindo para alavancar o setor no país, produzir jogos no Brasil ainda está longe de ser um mar de rosas, seja pela quantidade ainda limitada de incentivadores, seja pela visão de que jogos são "coisa de criança". Mas não é por falta de propostas e projetos!

Uma das iniciativas que tenta se posicionar no mercado brasileiro vem da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Trata-se da GDP, um grupo multidisciplinar de produção de jogos no meio acadêmico. Criado em 2007, a proposta do projeto, além do desenvolvimento de games, é produzir um ambiente de vivências para futuros profissionais que vão atuar nesse mercado.

Presentes em eventos como o BIG Festival, realizado em junho, e o SBGames (Simpósio Brasileiro de Jogos), que terminou nessa quinta (31), a GDP possui um catálogo de games disponibilizados ao público, além de uma coleção de prêmios e reconhecimentos. Entre eles, o Melhor Jogo no Voto Popular, no SBGames 2019, com o game Astropig.

Participantes da I Game Jam da Semana da Computação 2018, organizada pela GDP / Foto: Divulgação/GDP

O BetaQuest conversou com Victor Corrêa, um dos responsáveis pela gestão da GDP, para conhecer mais sobre como é produzir games dentro do ambiente universitário e o que eles esperam para esse mercado no Brasil. Leia a entrevista completa:


Como e quando surgiu a GDP?

Victor Corrêa: A GDP surgiu em 2007, como uma iniciativa de alunos de Ciência da Computação da UFRJ. Originalmente, era voltada para a programação e estudo de computação gráfica, mas com o passar do tempo se tornou um grupo multidisciplinar.

Quantas pessoas fazem parte da equipe? De que áreas do conhecimento?

Victor: A GDP atualmente conta com mais de cinquenta membros ativos, bem como uma comunidade de ex-membros que ainda montam uma rede de apoio, das diversas áreas de produção de jogos. Estas são principalmente o game design, a programação, arte 2D e 3D, roteiro e design de narrativa, música e design de áudio, além das tarefas de gestão e marketing. Nossos membros vêm de diferentes cursos, tais como letras, música, belas artes, engenharia, arquitetura, ciência da computação, farmácia, dentre outros.

Como surgiu o interesse em desenvolver games?

Victor: A história de cada membro é diferente e única. Muitos esboçam desde jovens um interesse com o desenvolvimento de jogos e até já possuem um portfólio amplo antes de chegar a nós, e alguns se interessam quando vêem a oportunidade através da nossa divulgação do grupo e do processo seletivo. Mas uma coisa é certa: todos gostam de jogos e têm vontade de criar e compartilhar sua própria obra com o mundo.

Primeira reunião com os membros de 2019 / Foto: Divulgação/GDP

Qual é o processo de produção dos jogos na GDP?

Victor: Uma ideia de jogo (pode ser uma mecânica, uma estética, uma história pra ser contada) é pensada por alguém, e apresentada em um documento para um setor chamado Gestão de Projetos. Os membros desse setor avaliam e oferecem feedback, a fim de melhorar as chances de sobrevivência desse projeto. Se ele for aprovado, ele passa a ser apresentado nas nossas Reuniões Gerais, semanalmente, e conta com um supervisor da Gestão de Projetos para garantir o andamento.

Internamente, os projetos geralmente são feitos em etapas incrementais, chamadas de sprints, desenvolvidas normalmente em ciclos semanais, até o término. Os programadores, artistas, músicos, roteiristas e game designers trabalham todos juntos da melhor forma que for para o projeto!

De onde vêm as ideias para o desenvolvimento dos jogos?

Victor: De qualquer lugar! De observação do mundo, jogando outros jogos, lendo livros, pensando no chuveiro, e, principalmente, conversando com outras pessoas sobre suas ideias de jogos. Uma ideia quase nunca vai ser exatamente reproduzida em um jogo da forma que foi concebida, mas muitos projetos nascem de ideias simples e depois vão sendo polidas conforme encontramos desafios de design ou melhores formas de executá-las.

Vocês já participaram de eventos de games? Quais os principais?

Victor: Sim! Existem vários eventos de jogos no Brasil, alguns mais voltados para desenvolvedores e outros para um público geral. Para o público geral, tivemos por exemplo esse ano a GameXP, aqui no Rio, e a Brasil Game Show, em São Paulo. De eventos de desenvolvedores, participamos do Brazil's Independent Games (BIG) Festival 2019 em SP, um dos maiores eventos da indústria do mundo e o maior da América Latina, tivemos no final do mês aqui no Rio o SBGames (Simpósio Brasileiro de Jogos), o maior evento acadêmico da área da América Latina, e vários outros eventos de cultura digital que participamos também, como o Rio2C, a Campus Party, o Hacktudo, o SJEEC, entre outros. Também fazemos parte do coletivo RING (Rio Indie Games), que reúne as empresas de desenvolvedores indie do Rio, e organizamos encontros periódicos em que temos palestras, painéis e exibição dos jogos!

Exibição de jogo VR da GDP na Campus Party 2019 / Foto: Divulgação/GDP

Vocês recebem ajuda da universidade para a manutenção do projeto? Se sim, qual a principal forma de incentivo?

Victor: O Instituto que nos abriga dentro da UFRJ, o NCE (Núcleo de Computação Eletrônica), nos cede o espaço de nossas áreas de trabalho e convívio, assim como área para eventos. O DCC (Departamento de Ciência da Computação), sob o qual o grupo foi criado, nos deu o apoio para a fundação do grupo e material de infraestrutura. Não recebemos qualquer espécie de incentivo financeiro, salvo quando alguns membros estão com bolsa de projeto de extensão relacionado a jogos — o que não acontece há algum tempo.

Como vocês vêem e qual a importância da produção de jogos na universidade?

Victor: Existe, no Brasil e no mundo, uma carência do ensino de desenvolvimento de jogos. Existem muitos cursos particulares, e até alguns públicos, mas eles são ainda insipientes e não estão bem-estabelecidos como outros cursos de produção de mídia, como cinema, por exemplo. A UFRJ não possui um curso de jogos. Por conta disso, a existência da GDP como um espaço em que os próprios estudantes possam adquirir conhecimento através de estudo e prática, é importantíssima.

Alguns membros e ex-membros da GDP estão atualmente no mercado de trabalho, atuando na indústria de jogos, por conta da vivência e das oportunidades que a GDP oferece. E acreditamos que, quanto maior o valor e o conhecimento conseguimos entregar para os membros, maior a qualidade profissional das empresas e dos jogos disponíveis futuramente no mercado.

Quais as principais conquistas da GDP atualmente? E os objetivos para o futuro?

Victor:  Apesar de termos tido relativo sucesso em competições e em criar boas conexões com a comunidade do Rio, nossas maiores conquistas estão relacionadas à cultura interna do grupo. A cada ano que se passa, adquirimos mais maturidade e novos insights sobre a forma de gerir todas essas pessoas interessadas em aprender e fazer jogos, e garantir que a experiência de cada um seja edificante e ajude no futuro, em suas carreiras profissionais.

Quais as dificuldades de se produzir jogos no Brasil, especialmente no meio universitário?

Victor: Na parte técnica, as dificuldades são as mesmas em todos os lugares do mundo [risos]! Mas em uma questão mais socioeconômica, existem muitos fatores complexos no Brasil. Mesmo sendo um dos maiores mercados consumidores de jogos do mundo, a quantidade de empresas formalizadas ainda é baixa — apesar de ter demonstrado um crescimento rápido. E por conta da distribuição online e digital, o mercado é o mundo inteiro, e é altamente competitivo.

Organizações de coletivos regionais, como o RING, a ADJogos (Rio Grande do Sul), o PiauIndie (Piauí) e a GaMinG (Minas Gerais), auxiliam as pequenas empresas em seus momentos iniciais e de aprendizado, porque muitas vezes existe a vontade de fazer jogos, de desenvolvedores, mas nem sempre se tem o conhecimento administrativo, financeiro e jurídico necessários para levantar um negócio. O meio universitário oferece um playground, porque os riscos não são tão altos caso um projeto fracasse (por não se tratar de um produto comercial).

O que vocês esperam para o cenário de games no país nos próximos anos?

Victor: Muito crescimento! Iniciativas como a Women Game Jam, a Game Jam Plus, a progressiva aceitação de projetos de jogos em editais como o Startup Rio, acelerações como a da Playbor, indicam que existe um interesse crescente em investir nesse mercado. Os investidores e acionistas ainda não estão acostumados a colocar muito dinheiro em jogos, mas estão observando a força desse mercado na China e nos Estados Unidos. E algo que auxilia bastante as pessoas a começarem é a quantidade de conhecimento e ferramentas disponíveis gratuitamente na internet.

A game engine [ferramenta de desenvolvimento de jogos] mais utilizada comercialmente atualmente, a Unity, é gratuita. A Unreal, outra ferramenta de alta performance, também é gratuita. Com fóruns, vídeos e cursos disponíveis na internet, é possível a qualquer um começar a fazer um jogo agora mesmo, mesmo não tendo nenhuma experiência anterior.

Precisamos que mais pessoas tentem, se arrisquem, e que o mercado amadureça, para que o Brasil também se torne a grande indústria que tem o potencial de ser

Os jogos da GDP são gratuitos e estão disponíveis para teste no site do grupo e também na Play Store. Acesse o Facebook, TwitterInstagram do projeto para ficar por dentro das novidades.


JOÃO PEDRO PINHEIRO

Sou apenas um ser humano, único, simples e complexo, que ama o que faz e faz o que ama. Como sou eu? Uma boa pergunta, que, com total certeza, pode receber esta resposta: “Sou eu”. Gosto de tirar umas fotos e fazer um som.
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